top of page

Portugal: nacionalidade e imigração

Atualizado: há 3 dias

 #Torre de Belém
Torre de Belén em Lisboa

E as questões sobre a nacionalidade e imigração em Portugal continuam tomando muito tempo, espaço e discussões, principalmente, nos últimos dias. Na sessão plenária de sexta-feira, 4 de julho, a Assembleia da República deu início à tramitação formal de um conjunto de propostas legislativas que prometem redefinir aspectos centrais da política migratória portuguesa.


Entre o que foi apresentado, destacam-se as propostas de alteração à “Lei da Nacionalidade e à Lei dos Estrangeiros”, ambas da autoria do Governo, e apoiadas politicamente por partidos da direita. Embora também tenham sido apreciadas iniciativas fiscais e de reorganização policial, foram os temas relativos à imigração e ao acesso à nacionalidade portuguesa que mais mobilizaram a atenção técnica e social.

Ponte romana
Ponte Romana

Como funciona a tramitação legislativa em Portugal?


Um projeto de lei pode tramitar pela Assembleia da República nas seguintes fases:

            1.         Admissão e distribuição: o texto é entregue na Mesa da Assembleia e atribuído à comissão competente.

            2.         Discussão e votação na generalidade: aprecia-se o princípio da proposta. Essa fase pode ser dispensada, a requerimento, caso haja consenso para que o texto baixe diretamente à especialidade.

            3.         Discussão na especialidade: feita em comissão parlamentar com debate artigo por artigo e possibilidade de emendas.

            4.         Votação final global: plenário delibera sobre o texto final.

            5.       Promulgação ou veto presidencial: o Presidente da República pode promulgar, vetar ou remeter ao Tribunal Constitucional para fiscalização preventiva.

 

O que aconteceu no dia 4 de julho de 2025?


1. Propostas sobre Nacionalidade e Imigração do Governo e do partido “Chega”:

             A Lei da Nacionalidade (Lei n.º 37/81, de 3 de outubro) e a Lei dos Estrangeiros (Lei n.º 23/2007, de 4 de julho) baixaram diretamente à especialidade, ou seja, foram enviadas para análise na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação na generalidade.

Essa modalidade regimental de tramitação, embora legítima, evita um primeiro debate em plenário sobre o mérito das propostas. Assim, o confronto de ideias e a exposição pública de argumentos ficam adiados para a fase final da tramitação.


2. Criação da UNEF (Unidade Nacional de Estrangeiros e Fronteiras)

Foi votada e aprovada na generalidade. Esta nova unidade, sob a alçada da PSP (Polícia de Segurança Pública), assumirá competências operacionais no controle de estrangeiros em território nacional, anteriormente exercidas pelo extinto SEF. Segue agora para discussão na especialidade.


3. Redução do IRS

Foi também aprovada na generalidade a proposta de redução do IRS (Imposto sobre rendimento das pessoas) para o ano de 2025. Embora não diretamente relacionada ao tema migratório, trata-se de medida com relevância orçamental e impacto social expressivo.

 

Tejo
Vista do Tejo

 Principais alterações nas propostas dos processos migratórios


Lei da Nacionalidade

  • Aumento do prazo de residência legal para aquisição da nacionalidade de 10 anos (geral),  7 anos (CPLP, países de língua portuguesa) e 3 anos para  progenitores  de filhos nascidos em Portugal

  • Inclusão de hipóteses de perda da nacionalidade por condenações penais  graves.

  • Redefinição dos critérios de atribuição por interesse nacional

 

Lei dos Estrangeiros

  •   Exigência de dois anos de residência legal para reagrupamento familiar

  •   Introdução de visto obrigatório para entrada, inclusive para nacionais da CPLP ( países de língua portuguesa)

  •   Restrições ao visto de trabalho: priorização de profissionais altamente qualificados

 

 Reações parlamentares e dos partidos


  •  Governo (PSD/CDS-PP) defende as alterações como ajustamento necessário à realidade migratória.

  • Partido Chega: propôs medidas ainda mais restritivas, como cotas e suspensão de reagrupamento.

  • PS aceitou a descida à especialidade, mas sinalizou preocupação com constitucionalidade.

  • BE, PCP e PAN consideraram as propostas discriminatórias e contrárias à dignidade humana.

  • Iniciativa Liberal apresentou reservas quanto aos impactos económicos das restrições.

 

Casario
Casario

Implicações constitucionais


As propostas legislativas sobre imigração e nacionalidade tocam em áreas protegidas por princípios estruturantes da Constituição da República Portuguesa, tais como:

            •           o princípio da igualdade (art. 13.º)

            •           o direito à unidade familiar (art. 36.º)

            •           a não discriminação por nacionalidade ou origem

            •           o princípio da proporcionalidade

 

A perda de nacionalidade por sentença penal, a restrição do reagrupamento familiar e a exigência de vistos para cidadãos dos países de língua portuguesa levantam sérias dúvidas de conformidade constitucional. É juridicamente possível — e politicamente previsível — que, após a aprovação final, o Presidente da República remeta as propostas ao Tribunal Constitucional para fiscalização preventiva (art. 278.º CRP).


A sessão parlamentar de 4 de julho de 2025 marcou o início de uma viragem legislativa no modo como Portugal trata o acesso à nacionalidade e a permanência de estrangeiros em seu território. A descida direta à especialidade adia o debate público mais amplo, mas não o substitui. O desafio que se impõe à advocacia, à sociedade civil e às instituições democráticas é de acompanhar com rigor técnico e espírito constitucional os próximos passos desse processo legislativo. O modo como um país legisla sobre quem pode ou não pertencer a ele diz, em última instância, muito sobre a sua própria identidade democrática.


Este parecer tem natureza informativa e não substitui aconselhamento jurídico individualizado.


Fotos: Arquivo Wix e Guiga Soares


Ana Maria Villaça é carioca e vive em Lisboa há mais há mais de sete anos. É advogada e consultora jurídica. Atua na área do Direito Migratório e Imobiliário auxiliando e orientando famílias que desejam entrar com procedimento de nacionalidade, vistos e regularização de residência e a viver legalmente em Portugal.


Não deixe de seguir nossos passeios, viagens e vivências também no Instagram e no Facebook.

Comments


siga!

  • Facebook - White Circle
  • Instagram - White Circle
  • YouTube - White Circle
bottom of page