Foto arquivo Confeitaria Colombo
Tempo nublado e chuvoso: o que fazer numa tarde de meio de semana? Melhor ideia: viajar pela história do Rio de Janeiro sem sair dele. Uma amiga e eu escolhemos comemorar os 125 anos de existência da tradicional e linda Confeitaria Colombo, história viva e preservada da nossa cidade.
Foto Guiga Soares
ESTILO BELLE ÉPOQUE
É em uma das muitas ruas estreitas com calçamento de paralelepípedos do Centro antigo do Rio, bem ali, na rua Gonçalves Dias, 32, que fica a Confeitaria Colombo. Fundada em setembro de 1894 por dois imigrantes portugueses, Joaquim Borges de Meireles e Manuel José Lebrão, a confeitaria tem uma arquitetura que nos remete aos tempos da Belle Époque, período do final do século XIX e do começo do século XX.
“Essa expressão também designa o clima intelectual e artístico do período em questão. Foi uma época marcada por profundas transformações culturais que se traduziram em novos modos de pensar e viver o cotidiano”.
Esse mesmo estilo ainda persiste em famosos cafés de algumas cidades da Europa, como em Paris (Café de la Paix), em Veneza (Café Florian) ou no Porto (Majestic Café),entre outras.
Em Buenos Aires, há outro exemplar desse tipo de arquitetura, o Café Tortoni. Aliás, a nossa joia de confeitaria está na lista dos 10 mais belos cafés do mundo do conhecido site U City Guides.
Foto arquivo Confeitaria Colombo
REUNIÃO DE INTELECTUAIS
Durante a fase da Belle Époque, proliferam esse tipo de espaços onde a intelectualidade se encontrava para longos papos sobre essas mudanças pelas quais o mundo estava passando.
No Rio e no Brasil também aconteceu o mesmo. “Como capital da República e centro cultural de todo o país, o Rio de Janeiro transformou a Confeitaria Colombo, e tudo que nela ocorria, num acontecimento nacional, que despertava a atenção de todos os brasileiros” (Reminiscências: a alegre roda da Colombo e algumas figuras do tempo de antigamente, Sylvia Bastos Tigre, Thessarus Editora). Olavo Bilac, Chiquinha Gonzaga, Rui Barbosa, Lima Barreto e Villa-Lobos foram alguns dos intelectuais brasileiros que marcavam seus encontros na confeitaria.
Alguns anos mais tarde, entre 1912 e 1918, a Confeitaria Colombo foi reformada. Ganhou os grandes espelhos de cristal que vieram da Antuérpia, na Bélgica, com molduras de madeira jacarandá que até hoje lá estão. Outro detalhe que vale à pena ressaltar é o piso de ladrilhos hidráulicos, presença constante em antigos palácios do século XIX. Produto artesanal, eles são produzidos um a um e garantia de uma beleza ímpar ao ambiente.
Foto Confeitaria Colombo
VIAGEM À MINHA INFÂNCIA
Esse local me traz lembranças agradáveis de criança. Sou a mais velha de dez netos. Dos oito filhos da minha avó que permaneceram vivos alguns não tiveram herdeiros. Uma das minha tias – ainda viva e com com 101 anos - trabalhava ali bem pertinho da Colombo. Outra tia que já faleceu e que não trabalhava, me levava até lá. Esperávamos a mais velha sair do seu emprego.O programa era o chá da tarde.
Lembro até hoje da alegria desse passeio. E, mais ainda: tenho na boca o gosto do bolo de laranja, do chocolate quente e das balinhas coloridas.
Achava esses momentos uma verdadeira festa. Sabores e cheiros se misturavam à beleza da decoração. Adorava aquele ambiente sofisticado com cara de castelo encantado cheio de espelhos, bules de prata e louças com fios dourados na borda. Ficava impressionada como aceitavam criança.
Minha mãe me colocava o melhor vestido e o sapato de “sair”, em geral, branco ou rosa. Nossa família tinha muita dificuldade de vida. Portanto, não podíamos passear muito, nem tampouco frequentar locais como a Colombo. Ou seja, momentos como esses eram raros. Só podiam existir porque minhas tias não tinham filhos e podiam me levar. Dessa vez, que retornei com minha amiga, essas lembranças infantis voltaram com força. Me senti privilegiada e agradecida pelas tias e pela oportunidade daquelas tardes agradáveis e saborosas.
Foto Guiga Soares
PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL DO RIO DE JANEIRO
A importância da Confeitaria Colombo ao longo desses 125 anos para a história da cidade é inegável. É tão simbólica que em 1983 se tornou patrimônio cultural pelo INEPAC (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural) e em 2017, patrimônio imaterial municipal pelo IRPH (Instituto Rio Patrimônio da Humanidade). Hoje, o local faz parte da lista de passeios turísticos da cidade.
Dessa última vez que estive lá, logo na entrada, vi mais de um grupo de turistas estrangeiros acompanhados de guias. Na fila, quando esperava uma mesa, os idiomas eram vários. Em inglês, espanhol e francês, todos estavam deslumbrados. E, é claro, as câmeras dos aparelhos de celular se viravam para todos os ângulos da confeitaria. Hoje, a empresa tem uma pequena e charmosa filial no Forte de Copacabana de frente para o mar, outra ainda menor no CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil) também no Centro e um ponto no aeroporto internacional.
Foto Guiga Soares
FESTA DE SABORES NO CARDÁPIO E NAS VITRINES
No cardápio, além dos deliciosos bolos e tortas, inclusive o de laranja, também, estão os famosos salgadinhos. Coxinhas de frango, croquetes e bolinhos povoam as vitrines seculares. No segundo andar, há um bufê com preço fixo. Uma alegria para os olhos e para o estômago dos almoços de executivos e empresários que têm seus escritórios em prédios da vizinhança.
Há alguns anos, acho que em 2011, fui a uma festa de casamento no local. O serviço foi no segundo andar e a pista de dança no térreo. Foi uma surpresa. A equipe deu um jeito e conseguiu reverter aquele espaço da Belle Époque num clima dancing.
Sempre indico essa visita à Confeitaria Colombo aos meus amigos, tanto brasileiros como estrangeiros. Além dos pratos deliciosos, ali ainda está presente a história de uma cidade que foi capital do país. Se você mora no Rio ou está de passagem, não deixe ir. É imperdível. E aproveita o passeio e vai conhecer o Real Gabinete Português de Leitura, outra maravilha do mundo que fica bem pertinho da Colombo.
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